e-book grátis: MEMÓRIAS PÓSTUMAS DE BRÁS CUBAS, Machado de Assis

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O livro MEMÓRIAS PÓSTUMAS DE BRÁS CUBAS marca um momento no cenário literário nacional em que Machado de Assis rompe com duas tendências literárias dominantes de seu tempo: a dos realistas que seguiam a teoria de Flaubert, do “romance que narra a si próprio” e que apaga o narrador atrás da objetividade da narrativa; e a dos naturalistas que, na esteira de Zola, pregavam o “inventário maciço da realidade”, observada nos menores detalhes. Ao invés disso, Machado de Assis constrói um livro em que cultiva o incompleto, o fragmentário, intervindo na narrativa para conversar diretamente com o leitor e comentar o próprio romance e suas personagens e fatos. O livro é permeado por intertextualidade e ironias. O livro marca um tom cáustico e novo estilo na obra de Machado de Assis. Para o crítico literário estadunidense Harold Bloom, Machado de Assis é o maior escritor negro de todos os tempos.

O livro Memórias Póstumas de Brás Cubas tem como marcas um tom cáustico e novo estilo na obra de Machado de Assis, bem como audácia e inovação temática no cenário literário nacional, que o fez receber, à época, resenhas estranhadas. Confessando adotar a “forma livre” de Laurence Sterne em seu Tristram Shandy (1759–67), ou de Xavier de Maistre, em Memórias Póstumas rompe com a narração linear e objetivista de autores proeminentes da época, como Flaubert e Zola, para retratar o Rio de Janeiro e sua época em geral com pessimismo, ironia e indiferença — um dos fatores que fizeram com que fosse amplamente considerada a obra que iniciou o Realismo no Brasil, ainda que com elementos livres e próprios a Machado de Assis.

Memórias Póstumas de Brás Cubas retrata a escravidão, as classes sociais, o cientificismo e o positivismo da época, chegando a criar, inclusive, uma nova filosofia — mais bem desenvolvida posteriormente em Quincas Borba (1891) — o Humanitismo, sátira à lei do mais forte do “darwinismo social”. Críticos e escritores também atestam que, com esse romance, Machado de Assis antecipou e precedeu uma série de elementos de vanguarda que só seriam ampliados e assimilados no século seguinte, sejam do Modernismo e da Semana de 22, da Poesia Concreta, da literatura fantástica e do realismo mágico de autores como Jorge Luis Borges, Julio Cortázar e brasileiros, e, de fato, alguns chamam-na “primeira narrativa fantástica do Brasil”, ainda que o fantástico seja apenas um traço de humor para retrrar a realidade sem pudores. O livro influencia e influenciou gerações de escritores como John Barth, Donald Barthelme e Ciro dos Anjos, e é notado como uma das obras mais revolucionárias e inovadoras da literatura brasileira. Mesmo depois de mais de um século de sua publicação original, ainda tem recebido inúmeros estudos e interpretações, adaptações para diversas mídias e traduções para outras línguas. Em 2020, por exemplo, uma nova tradução para o inglês esgotou em um dia após seu lançamento nos EUA.

O gênero é realista por criticar com ironia e pessimismo as condições da época, no entanto não está isento de resíduos românticos presentes nos romances, nas paixões e nos amores de Brás Cubas, ainda que o sonho de relações e casamentos perfeitos e a tensão bem x mal, herói x vilão—situações tão convencionais à ficção romanesca—não exista e as personagens ajam calculadamente por puro interesse na obtenção de “status social”, na ascensão social através do casamento, como quando o pai de Brás quer que ele se case com Virgília, filha do Conselheiro Dutra, político proeminente. E mesmo assim, Machado não compactua com o esquematismo determinista dos realistas, nem procura causas muito explícitas ou claras para a explicação das personagens e situações. O fato do narrador tentar relatar suas memórias e recriar o passado faz com que o romance também se enquadre em certos elementos do romance impressionista.

Dois outros gêneros significativos em Memórias Póstumas são as antecipações modernas da obra—a estrutura fragmentária não-linear, o gosto pelo elíptico e alusivo e a postura metalinguística de quem escreve e se vê escrevendo (Brás Cubas no início declara explicitamente basear-se em Laurence Sterne). O outro elemento, a fantasia, é encontrada em duas situações: Brás Cubas, mesmo morto e enterrado, ainda assim escreve sua autobiografia e, no Capítulo VII, tem um delírio em que viaja montado num hipopótamo e encontra-se com Pandora, que é interpretado como uma forma de mostrar que o ser humano nada mais é do que um verme diante da Natureza. De fato, certos autores referem-se a esta obra como “a primeira narrativa fantástica do Brasil”. O caráter fantástico e realista, cômico e sério, e que também mistura cartas e novelas a uma trama global, além de não haver nenhum enobrecimento dos personagens e de suas ações, deu margem a José Guilherme Merquior escrever que o verdadeiro gênero de Memórias Póstumas de Brás Cubas seria o cômico-fantástico, também conhecido como literatura menipeia.

Memórias Póstumas de Brás Cubas marca um momento no cenário literário nacional em que Machado de Assis rompe com duas tendências literárias dominantes de seu tempo: a dos realistas que seguiam a teoria de Flaubert, do “romance que narra a si próprio” e que apaga o narrador atrás da objetividade da narrativa; e a dos naturalistas que, na esteira de Zola, pregavam o “inventário maciço da realidade”, observada nos menores detalhes. Ao invés disso, Machado de Assis assume postura inovadora e proto-modernista, porque constrói um livro em que cultiva o incompleto, o fragmentário, intervindo na narrativa para conversar diretamente com o leitor e comentar o próprio romance e suas personagens e fatos.

Tornou-se comum atribuir à leitura do livro um caráter de diversão e prazer por detrás de sua perspectiva desencantada. Entre seus traços, destacam-se os do universalismo, psicologismo, de arquétipos e o uso de um estilo “enxuto” por primar “pelo equilíbrio, pela disciplina clássica, pela correção gramatical e pela concisão, pela economia vocabular”. Assim, Machado seria sóbrio e parcimonioso, ao contrário de Castro Alves, José de Alencar e Rui Barbosa que abusariam imoderadamente do adjetivo e do advérbio. De fato, Francisco  Achcar escreve que o livro é sem vocabulário difícil e que “alguma dificuldade que pode ter um leitor de hoje se deve ao fato de que certas palavras caíram em desuso”. A linguagem de Memórias Póstumas de Brás Cubas, contudo, não é simétrica e mecânica, mas possui um ritmo.

O livro é permeado por intertextualidade e ironias. O segundo recurso logo nota-se na “Dedicatória” de Brás Cubas ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver. A ironia é vista como uma forma de “revolta pela vida” usada por Machado para fazer rir, quando como por exemplo Brás Cubas escreve: a sabedoria humana não vale um par de botas curtas […] Tu, minha Eugênia, é que não as descalçaste nunca à personagem que era coxa de nascença, num célebre exemplo de humor negro. O primeiro recurso, por sua vez, refere-se às referências machadianas aos estilos de outros grandes autores do Ocidente: “Na maioria dos casos, essas referências são implícitas, só podem ser percebidas por leitores familiarizados com as grandes obras da literatura.” Brás Cubas, por exemplo, refere-se no início do livro a Xavier de Maistre e depois a obras como a Suma Teológica. Por conta disso os críticos notam que o estilo machadiano é “culto” por “fazer uso da cultura e sua compreensão aprofundada exige cultura da parte do leitor.” Para saber mais sobre as intertextualidades no livro, vá à seção Influências literárias abaixo.

Memórias Póstumas de Brás Cubas antecipa muitos elementos de vanguarda que só serão amplamente assimilados pelo público e explorados pelos artistas no século seguinte ao que foi publicado, conforme atestam autores como Donaldo Schülere José Paulo Paes.Neste aspecto, destacam-se os capítulos LV: O velho diálogo de Adão e Eva e CXXXIX: De como não fui ministro d’Estado, cujos diálogos são pontilhados, recurso tipográfico incomum na ficção da época,mas que, no romance, serve para deixar pensamentos, ações e falas subentendidas.

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