e-book grátis: A Ética, Baruch Spinoza

 

© Copyright 2021, VirtualBooks Editora. Ética, demonstrada na ordem geométrica, Baruch Spinoza (Benedictus de Spinoza, (Amsterdã, 24 de novembro de 1632 — Haia, 21 de fevereiro de 1677). Pará de Minas, MG, Brasil: VirtualBooks Editora, 2021. Ética. Filosofia. Religião. Tradutora: Geovanna Gravet. ISBN 978-65-5606-071-2 – Projeto gráfico e Ilustração: Studio VB-  Todos os direitos reservados, protegidos pela lei 9.610/98.



Baruch Spinoza

A ÉTICA 

Ética,
demonstrada na ordem geométrica.


APRESENTAÇÃO

 

Ética, demonstrada na ordem
geométrica
(latim: Ethica, ordine geometrico demonstrata), normalmente
conhecida como a ética, é um tratado filosófico escrito em latim por Baruch
Spinoza (Benedictus de Spinoza). Foi escrito entre 1661 e 1675 e foi publicado
pela primeira vez postumamente em 1677.

O livro é talvez a tentativa
mais ambiciosa de aplicar o método de Euclides na filosofia. Spinoza apresenta
um pequeno número de definições e axiomas dos quais ele tenta derivar centenas
de proposições e corolários, como “Quando a Mente imagina sua própria
falta de poder, ela se entristece com isso”, “Um homem livre pensa de
nada menos do que da morte”, e “A mente humana não pode ser
totalmente destruída com o corpo, mas permanece algo que é eterno. “

Parte I: De Deus

A primeira parte do livro
trata da relação entre Deus e o universo. Spinoza estava engajado com uma
Tradição que sustentava: Deus existe fora do universo; Deus criou o universo
por uma razão; e Deus poderia ter criado um universo diferente de acordo com
sua vontade. Spinoza nega cada ponto. De acordo com Spinoza, Deus é o mundo
natural. Spinoza conclui o seguinte: Deus é a substância que compreende o
universo, com Deus existindo em si mesmo, não de alguma forma fora do universo;
e o universo existe como o faz por necessidade, não por causa de uma razão ou
vontade teológica divina.

Spinoza argumenta por meio
de proposições. Ele sustenta que a conclusão deles é meramente a conclusão
lógica necessária da combinação das Definições e Axiomas fornecidos. Ele começa
com a proposição de que “não pode existir no universo duas ou mais substâncias
com a mesma natureza ou atributo”. Ele segue argumentando que os objetos e
eventos não devem ser meramente causados
​​se ocorrerem, mas ser evitados se não
ocorrerem.

Por uma contradição lógica, se algo não é contraditório,
não há razão para que não exista. Spinoza constrói a partir dessas ideias
iniciais. Se a substância existe, deve ser infinita, porque, se não fosse
infinita, outra substância finita teria de existir para ocupar as partes
restantes de seus atributos finitos, algo que é impossível de acordo com uma
proposição anterior. Spinoza então usa o Argumento Ontológico como
justificativa para a existência de Deus e argumenta que Deus (que deve ser lido
como “natureza”, ao invés de divindade tradicional) deve possuir
todos os atributos infinitamente. Visto que duas coisas não podem compartilhar
atributos, “além de Deus, nenhuma substância pode ser concedida ou concebida”.

Como acontece com muitas das
afirmações de Spinoza, o que isso significa é uma questão de disputa. Spinoza
afirma que as coisas que constituem o universo, incluindo os seres humanos, são
os “modos” de Deus. Isso significa que tudo depende, em certo sentido,
de Deus. A natureza dessa dependência é contestada. Alguns estudiosos dizem que
os modos são propriedades de Deus no sentido tradicional.

Outros dizem que os modos
são efeitos de Deus. De qualquer forma, os modos também são logicamente
dependentes da essência de Deus, neste sentido: tudo o que acontece decorre da
natureza de Deus, assim como segue da natureza de um triângulo que seus ângulos
são iguais a dois ângulos retos. Visto que Deus tinha que existir com a
natureza que ele tem, nada do que aconteceu poderia ter sido evitado, e se Deus
fixou um destino particular para um modo particular, não há como escapar disso.
Como diz Spinoza: “Uma coisa que foi determinada por Deus para produzir um
efeito não pode se tornar indeterminada.” A criação do universo por Deus
não é uma decisão, muito menos motivada por um propósito.

 

Parte II: Da Natureza & Origem da Mente

A segunda parte enfoca a
mente e o corpo humanos. Spinoza ataca várias posições cartesianas: que a mente
e o corpo são substâncias distintas que podem afetar um ao outro; que
conhecemos nossas mentes melhor do que conhecemos nossos corpos; que nossos
sentidos podem ser confiáveis; que apesar de criados por Deus podemos cometer
erros, nomeadamente, quando afirmamos, por nossa própria vontade, uma ideia que
não é clara e distinta. Spinoza nega cada um dos pontos de Descartes.

Spinoza argumenta que a
mente e o corpo são uma única coisa está sendo pensado de duas maneiras
diferentes. Toda a natureza pode ser totalmente descrita em termos de
pensamentos ou em termos de corpos. No entanto, não podemos misturar essas duas
maneiras de descrever as coisas, como faz Descartes, e dizer que a mente afeta
o corpo ou vice-versa. Além disso, o autoconhecimento da mente não é
fundamental: ela não pode conhecer seus próprios pensamentos melhor do que
conhece as maneiras pelas quais outros corpos atuam em seu corpo.

Além disso, não há diferença
entre contemplar uma ideia e pensar que ela é verdadeira, e não há liberdade de
vontade de forma alguma. A percepção sensorial, que Spinoza chama de
“conhecimento do primeiro tipo”, é totalmente imprecisa, pois reflete
como nossos próprios corpos funcionam mais do que como as coisas realmente são.
Também podemos ter um tipo de conhecimento preciso denominado “conhecimento
do segundo tipo” ou “razão”. Isso abrange o conhecimento das
características comuns a todas as coisas e inclui princípios de física e
geometria. Também podemos ter “conhecimento de terceiro tipo” ou
” conhecimento intuitivo “. Este é um tipo de conhecimento que, de
alguma forma, relaciona coisas particulares à natureza de Deus.

Parte III: da origem e
natureza das emoções

Na terceira parte da Ética,
Spinoza argumenta que todas as coisas, incluindo os seres humanos, se esforçam
para perseverar em seu ser. Isso geralmente significa que as coisas tentam
durar o máximo que podem. Spinoza explica como esse esforço (“conatus”)
está por trás de nossas emoções (amor, ódio, alegria, tristeza e assim por
diante). Nossa mente é, em certos casos, ativa e, em certos casos, passiva. Na medida
em que tem ideias adequadas, é necessariamente ativo e, na medida em que tem
ideias inadequadas, é necessariamente passivo.

Parte IV: Da Servidão da
Humanidade, ou a força das emoções

A quarta parte analisa as
paixões humanas, que Spinoza vê como aspectos da mente que nos dirigem para
fora, em busca do que dá prazer e afastam o que dá dor. A
“escravidão” a que ele se refere é o domínio dessas paixões ou ”
afetos “, como ele as chama. Spinoza considera como os afetos, sem governo,
podem atormentar as pessoas e tornar impossível para a humanidade viver em
harmonia uns com os outros.

Parte V: Do poder do
intelecto, ou a liberdade da Humanidade

A quinta parte argumenta que
a razão pode governar os afetos na busca da virtude, o que para Spinoza é a
autopreservação: somente com a ajuda da razão os humanos podem distinguir as
paixões que verdadeiramente auxiliam a virtude daquelas que são prejudiciais em
última instância. Pela razão, podemos ver as coisas como elas realmente são,
sub specie aeternitatis, “sob o
aspecto da eternidade”, e porque Spinoza trata Deus e a natureza como
indistinguíveis, por conhecer as coisas como elas são, melhoramos nosso
conhecimento de Deus. Vendo que todas as coisas são determinadas pela natureza
como são, podemos alcançar a tranquilidade racional que melhor promove nossa
felicidade e nos libertar de sermos impelidos por nossas paixões.

 

Deus ou a Natureza

De acordo com Spinoza, Deus
é Natureza e Natureza é Deus (Deus sive Natura). Este é o seu panteísmo. Em seu
livro anterior, Tratado Teológico-Político, Spinoza discutiu as inconsistências
que resultam quando se presume que Deus tem características humanas. No
terceiro capítulo desse livro, ele afirmou que a palavra “Deus”
significa o mesmo que a palavra “Natureza”. Ele escreveu: “Quer
digamos… que todas as coisas acontecem de acordo com as leis da natureza, ou
são ordenadas por decreto e direção de Deus, dizemos a mesma coisa.” Mais
tarde, ele qualificou essa afirmação em sua carta a Oldenburg, renunciando ao
materialismo. Natureza, para Espinosa,, não matéria física. Neste livro
publicado postumamente Ética, ele equiparou Deus à natureza ao escrever
“Deus ou Natureza” quatro vezes. “Para Spinoza, Deus ou Natureza
– sendo uma e a mesma coisa – é o sistema total, infinito, eterno,
necessariamente existente, ativo do universo dentro do qual absolutamente tudo
existe. Este é o princípio fundamental da Ética.”

Spinoza afirma que tudo o
que existe faz parte da natureza, e tudo na natureza segue as mesmas leis
básicas. Nessa perspectiva, os seres humanos são parte da natureza e, portanto,
podem ser explicados e compreendidos da mesma forma que tudo o mais na
natureza. Esse aspecto da filosofia de Spinoza – seu naturalismo – era radical
para sua época, e talvez até hoje. No prefácio da Parte III da Ética (relativa
às emoções), ele escreve:

A maioria dos escritores
sobre emoções e conduta humana parece estar tratando mais de assuntos externos
à natureza do que de fenômenos naturais que seguem as leis gerais da natureza.
Eles parecem conceber o homem situado na natureza como um reino dentro de um
reino: pois acreditam que ele perturba em vez de seguir a ordem da natureza,
que tem controle absoluto sobre suas ações e que é determinado apenas por si
mesmo. No entanto, meu argumento é este. Nada acontece na natureza, o que pode
ser considerado uma falha nela; pois a natureza é sempre a mesma, e em todos os
lugares uma e a mesma em sua eficácia e poder de ação; isto é, as leis e
ordenanças da natureza, por meio das quais todas as coisas acontecem e mudam de
uma forma para outra, estão em toda parte e são sempre as mesmas.

 

Ética

Portanto, Spinoza afirma que
as paixões do ódio, da raiva, da inveja, e assim por diante, consideradas em si
mesmas, “decorrem dessa mesma necessidade e eficácia da natureza;
respondem a certas causas definidas, pelas quais são compreendidas, e possuem
certas propriedades tão dignos de serem conhecidos quanto as propriedades de
qualquer outra coisa”. Os humanos não são diferentes em espécie do resto
do mundo natural; eles fazem parte disso.

O naturalismo de Spinoza
pode ser visto como decorrente de seu firme compromisso com o princípio da
razão suficiente, que é a tese de que tudo tem uma explicação. Ele articula o
psr de maneira forte, visto que o aplica não só a tudo o que é, mas também a
tudo o que não é:

De tudo, seja qual for, uma
causa ou razão deve ser atribuída, seja para sua existência ou para sua
inexistência – por exemplo, se um triângulo existe, uma razão ou causa deve ser
concedida para sua existência; se, pelo contrário, não existe, deve também ser
concedida uma causa que a impeça ou anule a sua existência.

 

Ética, Parte 1, XI

E para continuar com o
exemplo do triângulo de Spinoza, aqui está uma afirmação que ele faz sobre
Deus:

Do poder supremo de Deus, ou
natureza infinita, um número infinito de coisas – isto é, todas as coisas
necessariamente fluíram em um número infinito de maneiras, ou sempre fluem da
mesma necessidade; da mesma forma que da natureza de um triângulo segue-se
desde a eternidade e para a eternidade que seus três ângulos internos são
iguais a dois ângulos retos.

 

Ética, Parte 1, XVII

Spinoza rejeitou a ideia de
um Criador externo repentinamente, e aparentemente caprichosamente, criando o
mundo em um determinado momento ao invés de outro, e o criando do nada. A
solução parecia-lhe mais desconcertante do que o problema, e um tanto
anticientífico em espírito, por envolver uma quebra de continuidade. Ele
preferia pensar em todo o sistema de realidade como seu próprio fundamento.
Essa visão era mais simples; evitou a concepção impossível da criação a partir
do nada; e era religiosamente mais satisfatório por trazer Deus e o homem a um
relacionamento mais íntimo.

Em vez da Natureza, por um
lado, e um Deus sobrenatural, do outro, ele postulou um mundo de realidade, ao
mesmo tempo Natureza e Deus, e não deixando espaço para o sobrenatural. O
chamado naturalismo de Spinoza só é distorcido se partirmos de uma ideia
materialista grosseira da Natureza e se supor que Spinoza degradou Deus.

A verdade é que ele elevou a
Natureza ao nível de Deus ao concebê-la como a plenitude da realidade, como o
Um e o Todo. Ele rejeitou a ilusória simplicidade que se pode obter negando a
realidade da Matéria, ou da Mente, ou de Deus. O sistema cósmico compreende
todos eles. Na verdade, Deus e a Natureza tornam-se idênticos quando cada um é
concebido como o Perfeito Auto-Existente. Isso constitui o de Spinoza Deus e a
Natureza tornam-se idênticos quando cada um é concebido como o Perfeito
Auto-Existente. Isso constitui o de Spinoza Deus e a Natureza tornam-se
idênticos quando cada um é concebido como o Perfeito Auto-Existente.

De acordo com Spinoza, Deus
tem “atributos”. Um atributo é ‘extensão’, outro atributo é
‘pensamento’ e existem infinitos atributos desse tipo. Uma vez que Spinoza
afirma que existir é agir, alguns leitores consideram “extensão” como
se referindo a uma atividade característica dos corpos (por exemplo, o processo
ativo de ocupar espaço, exercer poder físico ou resistir a uma mudança de lugar
ou forma). Eles consideram “pensamento” como se referindo à atividade
característica das mentes, a saber, o pensamento, o exercício do poder mental.
Cada atributo possui modos. Todos os corpos são modos de extensão e todas as ideias
são modos de pensamento.

As ideias de Spinoza
relativas ao caráter e estrutura da realidade são expressas por ele em termos
de substância, atributos e modos. Esses termos são muito antigos e familiares,
mas não no sentido em que Spinoza os emprega. Para compreender Spinoza, é
necessário deixar de lado todos os preconceitos sobre eles e seguir Spinoza de
perto. Spinoza achou impossível compreender os objetos e eventos finitos,
dependentes e transitórios da experiência sem assumir alguma realidade não
dependente de qualquer outra coisa, mas Auto-Existente, não produzida por outra
coisa senão eterna, não restrita ou limitada por qualquer outra coisa, menos
infinito. Essa realidade não causada e autossustentável, ele chamou substância.
Assim, por exemplo, ele não poderia compreender a realidade dos objetos
materiais e eventos físicos sem assumir a realidade de uma força física Auto-Existente,
infinita e eterna que se expressa em todos os movimentos e mudanças que
ocorrem, como dizemos, no espaço.

Ele chamou essa força física
de extensão e a descreveu, a princípio, como uma substância, no sentido que
acabamos de explicar. Da mesma forma, ele não conseguia entender as várias
experiências mentais dependentes e transitórias com as quais estamos
familiarizados sem assumir a realidade de uma consciência Auto-Existente,
infinita e eterna, força mental ou energia mental, que se expressa em todas
essas experiências finitas de perceber e compreender, de sentir e se esforçar.
Ele chamou essa consciência ou energia mental de pensamento e também a
descreveu, a princípio, como uma substância. Cada uma dessas
“substâncias” ele considerava infinita de sua espécie (isto é,
exaustiva de todos os eventos de sua própria espécie) e irredutível à outra ou
a qualquer outra substância. Mas, em vista da maneira íntima com que Extensão e
Pensamento se expressam conjuntamente na vida do homem, Spinoza considerou
necessário conceber Extensão e Pensamento não como realidades isoladas, mas
como constituindo um todo ou sistema orgânico. E para expressar essa ideia, ele
então descreveu Extensão e Pensamento como atributos, reservando o termo
Substância para o sistema que eles constituem entre eles. Esta mudança de
descrição não pretendia negar que Extensão e Pensamento são substâncias no
sentido de serem Auto-Existentes, etc. Pretendia apenas expressar sua coerência
em um sistema. O sistema, é claro, seria mais do que qualquer atributo. Pois
cada atributo é apenas infinito em sua espécie ; o sistema de todos os
atributos é absolutamente infinito, ou seja, esgota toda a realidade. Espinosa,
portanto, agora restringia o termo “substância” ao sistema completo,
embora ocasionalmente continuasse a usar a frase “substância ou
atributo”, ou descrevesse a Extensão como uma substância.

Como comumente usado,
especialmente desde a época de Locke, o termo substância é contrastado com seus
atributos ou qualidades como substrato ou portador. Mas esse significado não
deve ser lido em Spinoza. Para Spinoza, a Substância não é o suporte ou
portador dos Atributos, mas o sistema de Atributos – ele na verdade usa a
expressão “Substância ou os Atributos”. Se há alguma diferença entre
“Substância” e “os Atributos”, como Spinoza usa esses
termos, é apenas a diferença entre os Atributos concebidos como um sistema
orgânico e os Atributos concebidos (mas não por Spinoza) como uma mera soma de
forças destacadas. Algo ainda é necessário para completar o relato da concepção
de substância de Spinoza. Até agora, apenas os dois Atributos foram
considerados, a saber, Extensão e Pensamento. Spinoza, no entanto, percebeu que
pode haver outros Atributos, desconhecidos para o homem. Nesse caso, eles são
parte de uma única substância ou sistema cósmico. E usando o termo ”
infinito ” no sentido de “completo” ou “exaustivo”,
ele atribuiu à Substância uma infinidade de Atributos, isto é, todos os
atributos que existem, sejam conhecidos pelo homem ou não.

Agora, a realidade, para
Spinoza, é atividade. A substância é incessantemente ativa, cada Atributo
exercendo seu tipo de energia de todas as maneiras possíveis. Assim, os vários objetos
e eventos do mundo material passam a existir como modos (modificações ou
estados) do atributo Extensão; e as várias mentes e experiências mentais surgem
como modos do atributo Pensamento (ou Consciência). Esses modos não são
criações externas dos Atributos, mas resultados imanentes – eles não são
“jogados fora” pelos Atributos, mas são estados (ou modificações)
deles, como ondas de ar são estados do ar. Cada Atributo, entretanto, se
expressa em seus modos finitos não imediatamente (ou diretamente), mas
mediatamente (ou indiretamente), pelo menos no sentido a ser explicado agora.
Física galileana tendia a considerar todo o mundo dos fenômenos físicos como o
resultado de diferenças de movimento ou momento. E, embora concebida
erroneamente, a concepção cartesiana de uma quantidade constante de movimento
no mundo levou Spinoza a conceber todos os fenômenos físicos como tantas
expressões variáveis
​​daquele
estoque de movimento (ou movimento e repouso ).

Espinosa pode, é claro, ter
identificado a Extensão com a energia do movimento. Mas, com sua cautela usual,
ele parece ter suspeitado que o movimento pode ser apenas um dos vários tipos
de energia física. Assim, ele descreveu o movimento simplesmente como um modo
de Extensão, mas como um modo infinito (porque completo ou exaustivo de todos
os modos finitos de movimento) e como um modo imediato (como uma expressão
direta de Extensão). Novamente, o mundo físico (ou “a face do mundo como
um todo”, como Spinoza o chama) mantém uma certa mesmice, apesar das inúmeras
mudanças nos detalhes que estão acontecendo. Assim, Spinoza descreveu também o
mundo físico como um todo como um infinito modo de extensão
(“infinito” porque exaustivo de todos os fatos e eventos que podem
ser reduzidos ao movimento), mas como um modo mediato (ou indireto), porque ele
o considerou como o resultado da conservação do movimento (ele próprio um modo,
embora um modo imediato).

As coisas e eventos físicos
da experiência comum são modos finitos. Em essência, cada um deles faz parte da
Extensão de Atributo, que está ativa em cada um deles. Mas a finitude de cada
um deles se deve ao fato de ser restringido ou cercado, por assim dizer, por
outros modos finitos. Esta limitação ou determinação é negação no sentido de
que cada modo finito não é todo o atributo extensão; não são os outros modos
finitos. Mas cada modo é positivamente real e definitivo como parte do
Atributo.

Da mesma forma, o Pensamento
de Atributo exerce sua atividade em vários processos mentais e em sistemas de
processo mental que são chamados de mentes ou almas. Mas, neste caso, como no
caso da Extensão, Spinoza concebe os modos finitos de pensamento como mediados
por modos infinitos. O modo infinito imediato de pensamento, ele descreve como
“a ideia de Deus”; o modo infinito mediato ele chama de “a ideia
infinita” ou “a ideia de todas as coisas”. Os outros Atributos
(se houver) devem ser concebidos de maneira análoga. E todo o Universo ou
Substância é concebido como um sistema dinâmico do qual os vários Atributos são
as várias linhas de mundo ao longo das quais ele se expressa em toda a
variedade infinita de eventos.

Dada a persistente
interpretação errônea do Spinozismo, vale a pena enfatizar o caráter dinâmico
da realidade como Spinoza a concebeu. O sistema cósmico é certamente um sistema
lógico ou racional, de acordo com Spinoza, pois o pensamento é uma parte
constitutiva dele; mas não é

apenas um sistema lógico – é
dinâmico e também lógico. Seu uso frequente de ilustrações geométricas não
oferece nenhuma evidência em apoio a uma interpretação puramente lógica –
matemática de sua filosofia; pois Spinoza considerava figuras geométricas, não
de uma maneira platônica ou estática, mas como coisas traçadas por partículas
ou linhas em movimento, etc., ou seja, dinamicamente.

Sem inteligência não há vida
racional: e as coisas só são boas na medida em que auxiliam o homem no gozo da
vida intelectual, que é definida pela inteligência. Ao contrário, tudo o que
impede o homem de aperfeiçoar sua razão e capacidade de desfrutar a vida
racional é o único denominado mal.

 

Ética, Parte IV, Apêndice V

Para Spinoza, realidade
significa atividade, e a realidade de qualquer coisa se expressa em uma
tendência à autopreservação – existir é persistir. Nas coisas mais baixas, na
chamada matéria inanimada, essa tendência se mostra como uma “vontade de
viver”. Considerado fisiologicamente, o esforço é denominado apetite;
quando estamos conscientes disso, é chamado de desejo. As categorias morais,
bem e mal, estão intimamente ligadas ao desejo, embora não da maneira comumente
suposta.

O homem não deseja uma coisa
porque pensa que é boa, nem a evita porque a considera ruim; ao contrário, ele
considera qualquer coisa boa se o deseja, e considera ruim se ele tem aversão
por aquilo. Agora, tudo o que é sentido para aumentar a atividade vital dá
prazer; tudo o que for sentido para diminuir tal atividade causa dor.

O prazer juntamente com a
consciência de sua causa externa é chamado de amor, e a dor juntamente com a
consciência de sua causa externa é chamada de ódio – “amor” e
“ódio” sendo usados
​​no sentido
amplo de “gostar” e “n
ão
gostar”. Todos os sentimentos humanos s
ão derivados
do prazer, da dor e do desejo.

Spinoza fornece uma análise
detalhada de toda a gama de sentimentos humanos, e seu relato é um dos clássicos
da psicologia. Para o presente propósito, a distinção mais importante é aquela
entre sentimentos “ativos” e sentimentos “passivos” (ou
“paixões”).

O homem, de acordo com
Spinoza, é ativo ou livre na medida em que qualquer experiência resulta
unicamente de sua própria natureza; ele é passivo, ou um escravo, na medida em
que qualquer experiência se deve a outras causas além de sua própria natureza.

Os sentimentos ativos são
todos formas de auto-realização, de atividade intensificada, de força mental e,
portanto, são sempre prazerosos. São os sentimentos passivos (ou
“paixões”) os responsáveis
​​por todos os males da vida, pois são em grande
parte induzidos por coisas externas e frequentemente causam aquela diminuição
da vitalidade que significa dor. Em seguida, Spinoza vincula sua ética com sua
teoria do conhecimento, e correlaciona o progresso moral do homem com seu
progresso intelectual. No estágio mais baixo do conhecimento, o da
“opinião”, o homem está sob a influência dominante de coisas externas
a ele e, portanto, está sob a escravidão das paixões. No estágio seguinte, o
estágio da “razão”, o traço característico da mente humana, sua
inteligência, afirma-se e ajuda a emancipá-lo de sua escravidão aos sentidos e
atrativos externos. A compreensão adquirida sobre a natureza das paixões ajuda
a libertar o homem de seu domínio. Uma melhor compreensão de seu próprio lugar
no sistema cósmico e do lugar de todos os objetos de seu gosto e aversão, e sua
compreensão da necessidade que governa todas as coisas, tendem a curá-lo de
seus ressentimentos, arrependimentos e decepções. Ele se reconcilia com as
coisas e ganha paz de espírito. Desse modo, a razão ensina a aquiescência na
ordem universal e eleva a mente acima da turbulência da paixão.

No estágio mais elevado de
conhecimento, o de “conhecimento intuitivo”, a mente apreende todas
as coisas como expressões do eterno cosmos. Ele vê todas as coisas em Deus e
Deus em todas as coisas. Sente-se parte da ordem eterna, identificando seus
pensamentos com o pensamento cósmico e seus interesses com os interesses
cósmicos. Desse modo, torna-se eterno como uma das ideias eternas nas quais o
Atributo Pensamento se expressa, e atinge aquela “bem-aventurança”
que “não é a recompensa da virtude, mas a própria virtude”, isto é, a
alegria perfeita que caracteriza o eu perfeito atividade. Esta não é uma
conquista fácil ou comum. “Mas”, diz Spinoza, “tudo que é
excelente é tão difícil quanto raro.”

Pouco depois de sua morte em
1677, as obras de Spinoza foram colocadas no Índice de Livros Proibidos da
Igreja Católica. Condenações logo apareceu, como Aubert de Versé ‘s L’impie convaincu (1685). De acordo com o
subtítulo, nesta obra “os fundamentos do ateísmo [de Spinoza] são
refutados”.

Durante os cem anos
seguintes, se os filósofos europeus leram esse suposto herege, o fizeram quase
inteiramente em segredo. Quanto spinozismo proibido eles estavam introduzindo
em suas dietas permanece um assunto de intriga contínua. Locke, Hume, Leibniz e
Kant foram todos acusados
​​por
estudiosos posteriores de se entregarem a per
íodos de
Spinozismo enrustido. No final do s
éculo 18,
uma pol
êmica centrada na Ética escandalizou o cenário da
filosofia alemã.

A primeira tradução
conhecida da Ética para o inglês foi concluída em 1856 pelo romancista George
Eliot, embora só tenha sido publicada muito mais tarde. O livro a seguir
apareceu em inglês em 1883, pela mão do romancista Hale White. Spinoza apareceu
claramente para os metafísicos anglófonos no final do século XIX, durante a
mania britânica por Hegel. Em sua admiração por Spinoza, Hegel foi acompanhado
neste período por seus conterrâneos Schelling, Goethe, Schopenhauer e
Nietzsche. No século XX, o fantasma de Spinoza continuou a se mostrar, por
exemplo, nos escritos de Russell ,Wittgenstein, Davidson e Deleuze. Entre os
escritores de ficção e poesia, os pensadores influentes inspirados por Spinoza
incluem Coleridge, George Eliot, Melville, Borges e Malamud.

O contemporâneo de Spinoza,
Simon de Vries, levantou a objeção de que Spinoza falha em provar que as
substâncias podem possuir múltiplos atributos, mas que se as substâncias têm
apenas um único atributo, “onde há dois atributos diferentes, também
existem substâncias diferentes”. Esta é uma fraqueza séria na lógica de
Spinoza, que ainda não foi resolvida de forma conclusiva.

Alguns tentaram resolver
este conflito, como Linda Trompetter, que escreve que “atributos são
propriedades essenciais individualmente, que juntas constituem a única essência
de uma substância”, mas esta interpretação não é universal, e Spinoza não
esclareceu o questão em sua resposta a de Vries. Por outro lado, Stanley
Martens afirma que “um atributo de uma substância éessa substância; é essa
substância na medida em que tem uma certa natureza ” em uma análise das
idéias de atributos de Spinoza.

Schopenhauer afirmou que
Spinoza usou palavras erradas. “Assim, ele chama ‘Deus’ aquilo que em toda
parte é chamado de ‘mundo’; ‘justiça’ aquilo que em toda parte é chamado de
‘poder’; e ‘deseja’ aquilo que em toda parte é chamado de ‘julgamento’.”
Além disso, “aquele conceito de substância … com a definição de que
Spinoza consequentemente começa … aparece em uma investigação próxima e
honesta como uma abstração mais elevada, porém injustificada, do conceito de
matéria .” Apesar de suas objeções repetidas e observações críticas,
Schopenhauer incorporou alguns dos conceitos fundamentais de Spinoza em seu
sistema, especialmente sobre a teoria das emoções; havia também uma semelhança
notável entre Schopenhauer ‘ a vontade e a substância de Spinoza.

Na verdade, dentro da esfera
filosófica alemã, a influência de Spinoza no idealismo alemão foi notável. Ele
foi tanto um desafio quanto uma inspiração para as três principais figuras
desse movimento: Hegel, Schelling e Fichte – que buscaram definir suas próprias
posições filosóficas em relação às dele. Schopenhauer, que detestava esses três
filósofos em vários graus de intensidade, também tinha uma relação igualmente
ambivalente com o filósofo holandês. Não se sabe ao certo como Spinoza
influenciou Schopenhauer, mas pode-se especular: isso pode ter ocorrido em sua
exposição às palestras de Fichte, em suas conversas com Goethe ou simplesmente
por ser pego na tentativa pós- kantiana de repensar a filosofia crítica. Ainda
assim, seu envolvimento com o Spinozismo é evidente ao longo de seus escritos e
leitores atentos de sua obra principal podem de fato notar sua ambivalência em
relação à filosofia de Spinoza. Ele vê em Spinoza um aliado contra a cultura
febril do Ocidente. Por exemplo, no contexto de um relato bastante favorável do
“ponto de vista da afirmação”, ele observa que “a filosofia de
Bruno e a de Spinoza também podem trazer a este ponto de vista a pessoa cuja
convicção não foi abalada ou enfraquecida por seus erros e imperfeições “.
Além disso, ao discutir Spinoza e Giordano Bruno, Schopenhauer também afirma
que:

Não pertencem à sua idade
nem à sua parte do globo, que recompensou um com a morte e o outro com
perseguição e ignomínia. Sua existência miserável e morte neste mundo ocidental
são como a de uma planta tropical na Europa. As margens do Ganges eram seu lar
espiritual; ali eles teriam levado uma vida pacífica e honrada entre homens da
mesma opinião.

Dado o
respeito de Schopenhauer pela filosofia hindu, comentários como esses indicam
que ele também sentia uma afinidade intelectual com Spinoza. Em outro lugar,
Schopenhauer aponta para afinidades mais fundamentais, mas ele também critica
Spinoza. Essas críticas lidam com divergências fundamentais sobre a natureza
última da realidade e se ela deve ser afirmada ou negada.

 

 Para ler: https://bit.ly/3IZ1MMy 

 

 

 

 

© Copyright 2021, VirtualBooks Editora.

Publicamos seu livro a partir de 20 exemplares e-books nos formatos: e-pub ou PDF.

Whatsapp +55 37 99173-353

e-mail: capasvb@gmail.com

http://www.virtualbooks.com.br

 

*

Clube do Livro VirtualBooks

Caso queira divulgar o seu livro: capa, sinopse e seu e-mail. É grátis!

https://bit.ly/3rtVVIC

*


 

 

 

Grátis o e-book: ALÉM DO BEM E DO MAL, Friedrich Nietzsche

“Supondo que a verdade seja uma mulher.”

ALÉM DO BEM E DO MAL foi escrito em um tom mais crítico e denso, contrastando com os seus livros anteriores, como “Humano, Demasiado Humano“, “Aurora” e “A Gaia Ciência”, os quais foram escritos em um tom de leveza e serenidade. 

Publicado em 1886, nasceu de reflexões e anotações de Friedrich Nietzsche, durante a composição de “Assim Falou Zaratustra”, e inicia uma nova fase literário-filosófica do autor, a sua fase de negação e destruição.

Nietzsche considerava ALÉM DO BEM E DO MAL seu livro mais importante e mais abrangente. Quase todos os temas de sua filosofia madura estão presentes nele: o perspectivismo, a vontade de poder e suas ramificações, a crítica da moralidade, a psicologia da religião e a definição de um tipo de homem nobre, abarcando uma maior multiplicidade de assuntos e reflexões. Assim definiu Nietzsche este livro a seu amigo Jacob Burckhardt: “Peço-lhe que leia este livro (se bem que ele diga as mesmas coisas que o meu Zaratustra, mas de uma forma diferente, muito diferente)…”.

Para ler: https://bit.ly/3dZQg5g

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima