O
HERÓI SEM NENHUM CARÁTER AINDA SOBREVIVE
Macunaíma, o herói sem nenhum caráter é
um livro publicado em 1928 pelo polímata brasileiro Mário de
Andrade, considerado a sua obra-prima.
A crítica de Mario de Andrade a uma
sociedade que, formada de três raças, distintas consegue ter preconceitos
contra ela mesma. Não deixe de ler esta grande obra onde realidade e fantasia
se misturam formando uma composição única.
A personagem-título é um índio que
representa o povo brasileiro, mostrando a atração pela cidade grande de São
Paulo e pela máquina. A frase característica da personagem é “Ai, que
preguiça!”.
Como na língua indígena o som “ai
que” significa “preguiça”, Macunaíma seria duplamente
preguiçoso. A parte inicial da obra assim o caracteriza: “No fundo do
mato-virgem nasceu Macunaíma, herói de nossa gente. Era preto retinto e filho
do medo da noite.”
Escrito em pouco tempo, mas fruto de
pesquisas anteriores que o autor fazia sobre as origens e as especificidades da
cultura e do povo brasileiro, narra a história do herói índio Macunaíma desde
seu nascimento na selva até sua morte e transfiguração, uma trajetória
movimentada e aventuresca em que é ajudado por seus irmãos e outros
personagens, em busca de uma pedra mágica, o muiraquitã, que havia
recebido de seu grande amor, Ci, a Mãe do Mato, mas que fora perdida e acabara
em posse de Piaimã, um gigante comedor de gente que vivia como abastado burguês em São
Paulo.
A obra é de difícil classificação no
sistema dos gêneros literários; sua estrutura tem elementos de muitos gêneros
combinados, mas é muito elogiada como um experimento linguístico e literário extraordinariamente
original e bem-sucedido, que esconde sua erudição na aparente facilidade com
que integra modos de falar e elementos de crônicas, lendas, ditados e
contos folclóricos de todo o Brasil em uma narrativa coerente,
vigorosa, ágil e cativante. Também é admirada como uma penetrante reflexão
sobre a cultura e sociedade brasileira, sua história, seu presente e seu
destino.
Além de ter elementos que ainda hoje representam o Brasil, a
obra revela um enorme acervo de palavras indígenas, especificamente do tupi-guarani.
O mítico e o mágico fluem livremente ao
lado da realidade concreta e muitas vezes a transfiguram, impregnando-a de
novos significados. O protagonista é um personagem tão complexo, imprevisível e
pouco definível quanto o formato da narrativa, alterna entre momentos de aguda
perspicácia e estupidez, entre mansidão e brutalidade, entre grandeza e
vilania; é, com efeito, um ser sobre-humano, dotado de poderes mágicos, e vive
operando prodígios. Seu caráter e moralidade fora dos padrões, em particular,
bem como sua sexualidade exuberante e irrefreada, têm sido objeto de intensa
exploração crítica e debate.
O livro hoje é largamente conhecido no
Brasil, e seu protagonista saiu das suas páginas para ir viver no imaginário
coletivo da nação, tornando-se um ícone popular. Na mídia e na cultura
popular formou-se uma persistente imagem de Macunaíma como um retrato do
“brasileiro médio” e seu modo de viver e entender o mundo, geralmente
enfatizando traços negativos de preguiça, inconstância, libertinagem, covardia
e pouca confiabilidade, mas para a maioria dos críticos recentes essa visão é
um estereótipo pouco fiel à realidade.
É verdade que a acidentada e excitante
carreira do herói acaba em uma grande derrota: ele perde tudo ao que dava valor
e tudo que dava sabor à sua existência, perde seus amores, sua família, seu
império, e toda sua tribo se extingue; no final, solitário e desiludido, deixa
o mundo e vai para o céu, transformando-se numa constelação. Porém,
reivindicando a diversidade e miscigenação que marcaram a formação do
país, normalizando o imprevisto, e incorporando a liberdade, a imaginação, a
poesia e o maravilhoso ao cotidiano, ele tem sido entendido pelos pesquisadores
muitas vezes como um “anti-herói”, um símbolo da resistência ao colonialismo,
à massificação, à homogeneização e à higienização étnica e cultural, aos
preconceitos e discursos hegemônicos; um contraponto ao racionalismo frio
e desumanizante, ao mundo das convenções, das regras fixas, dos horários
rígidos e dos valores supostamente eternos e universais, cuja mensagem
permanece viva e pertinente para o presente.
A controvérsia, de fato, cercou a obra
desde seu lançamento em 1928, surgindo em um momento em que os
intelectuais modernistas procuravam tanto descobrir como redesenhar a
“verdadeira” identidade nacional, trabalhando num contexto conservador,
enfrentando a herança ainda muito viva do passado monárquico e colonial, e
lutando para abrir um caminho legítimo e novo para um futuro que não discerniam
com clareza.
A volumosa bibliografia crítica
que Macunaíma produziu e produz — sendo um dos livros brasileiros
mais estudados de todos os tempos — é repleta de polêmicas sobre o seu
significado, seus aspectos estéticos e suas implicações morais,
culturais, políticas, históricas e sociais. Porém, a crítica o reconhece
consensualmente como uma obra-prima e como um dos retinto e filho do medo da noite.
maiores marcos do Modernismo literário brasileiro, se não o maior.
É obra muito estudada também por
pesquisadores estrangeiros e foi traduzida para várias línguas. Tendo se
tornado uma das obras canônicas da literatura brasileira, já foi adaptada
para o cinema, os quadrinhos e o teatro, e serve como frequente referência em
vários domínios artísticos e culturais.
Grátis o e-book: MACUNAÍMA, Mário de
Andrade
Para ler: https://bit.ly/3kRF12T