Bion era um menino que não gostava de tomar banho. Não só não gostava de tomar banho, como também não gostava de jogar lixo na lixeira. Só jogava fora dela.
- O espaço fora da lixeira é muito maior, por isso a gente erra o alvo - desculpava-se.
Só isso? Não! Detestava fazer muitas outras coisas que o manual de boas maneiras recomenda. Chutava tudo o que encontrava pelo caminho, falava palavrão e ainda era respondão.
Quando tomava sorvete, saboreava a guloseima com gosto, despertando inveja nas crianças, lambuzando o rosto, a roupa, as mãos, o chão, enquanto caminhava bem devagar. Os lábios dele chegavam a ficar da mesma cor do sorvete. Ele não se importava com isso, por isso não os limpava.
Na escola era o único a sentar-se isolado, porque ninguém gostava de se sentar perto dele. Mas não pense você que Bion se chateava com isso. Nem um pouco. Ao contrario, ficava contente e se achava o máximo.
- Bion, Bion, Bion... – sua mãe vivia lhe dizendo. – Você vai sofrer muito na vida por causa desse seu comportamento esquisito.
- Vou nada, mãe! Eu vou é lucrar.
- De que jeito?
- De todo jeito.
- Como?
- Na escola, posso sentar onde quero e ninguém me incomoda.
- Mas você não sabe o que falam de você.
- E daí?
- E daí que não gosto que falem de meu filho nem inventem apelido pra ele. Seu pai também não. Nem seus avôs. Nem seus tios e primos. Nem ninguém da família!
- Preocupação boba, mãe. A senhora não devia se preocupar com isso.
Mas Dona Gracildes se preocupava. E se queixava aos familiares. Até que um dia alguém aconselhou-a a levá-lo ao psicólogo.
Dona Gracildes levou-o a Dra. Mírian, psicóloga da escola, e contou-lhe sua aflição.
A Drª. Mírian comprometeu-se em ajudar Bion.
Assim, no primeiro encontro com ele, ela lhe perguntou:
- Você se sente bem fazendo as coisas que faz?
- Não sei.
- Sente ou não sente?
- Às vezes sinto. Às vezes não.
- Você poderia me explicar melhor?
- É assim, tia... Quando alguém faz uma coisa que eu não gosto, quero fazer pra ele uma coisa que ele não gosta.
- Sim. E daí?
- Daí que quando me fazem coisas que eu gosto, fico com vergonha de só fazer o que eles não gostam.
- Ah! Então sua consciência lhe diz que é errado o que você faz?
- Não sei. O que é consciência?
A Drª. Mírian pegou o dicionário e leu a definição de consciência. Como Bion não conhecia o significado de algumas palavras, ela explicou-o na linguagem dele.
- A senhora quer dizer que eu posso saber se o que faço é certo ou errado?
- Isso, Bion. É como se existisse dentro de você um outro “Bion”, que lhe dissesse o tempo todo como fazer corretamente. Só que você não o obedece.
Depois disso Bion passou a observar mais sua “consciência”.
Em casa contou para os pais que havia dentro dele um outro “Bion”, que era o oposto dele e iria ajudá-lo. Só não sabia como esse outro “Bion” faria isso.